Chegou a hora de Gilmar Rinaldi falar só sobre a Seleção Brasileira atual. E muito sobre Neymar, a principal estrela de Dunga. Vou direto às perguntas. Elas são muitas.
Gilmar, você estava lá. Como é que aconteceu, em detalhes, a confusão envolvendo Neymar e o jogo da Colômbia, na Copa América?
O Brasil havia perdido o jogo. O Neymar estava muito nervoso, tenso. Ele havia disputado três finais na Europa. E ainda havia o problema do seu contrato com o Barcelona. Estava estressado. Sabíamos, mas não poderíamos abrir mão do seu futebol. Ele foi provocado, tomou pontapés, foi xingado, como é sempre. Não suportou, revidou. Foi expulso. E decidiu esperar o árbitro na entrada do vestiário do juiz (Enrique Osses, chileno). Eu fui avisado e tentei tirá-lo de lá.
Falei, fui firme. Falei que iria se prejudicar. Mandei um segurança puxá-lo de lá. O Neymar empurrou o segurança. Eu mandei então o segurança deixá-lo. O Neymar é um homem e tem de arcar com o que faz. Foi quando o juiz chegou e o Neymar falou que ele queria aparecer em cima dele, umas bobagens. Tomou uma atitude infantil que o prejudicou. Prejudicou o Brasil.
Mas eu quero deixar claro. Não tinha o direito de arrastá-lo à força. Ele é um homem. Um do principais jogadores do mundo. Se ele quer bater boca com juiz depois de expulso, precisa saber que vai se prejudicar. Foi o que aconteceu. Por isso não fiz questão nem de questioná-lo.
Gilmar, me desculpe, mas vou ser direto. Se fosse, por exemplo, o reserva do lateral direito que fizesse o que o Neymar fez, seria convocado novamente? Eu e o mundo sabemos que não. Esse privilégio ao Neymar que pega mal.
Não sou um homem de fugir das situações. Não sei se um reserva de lateral direito voltaria a ser convocado. Mas o Neymar vai porque ele é um dos principais jogadores do futebol mundial. Eu acredito que ele tenha aprendido com o que aconteceu. Depois da punição, ele me procurou e em disse. 'Me desculpe, fui mal. Não me controlei.' Então eu acredito que ele tenha aprendido. Porque eu te garanto que isso não acontecerá novamente. Jogador nenhum mais da Seleção vai falar com o juiz depois de um jogo. Nem o Neymar. Eu também aprendi. Acreditei no bom senso. Errei também.
Como vocês tiveram coragem de dar a tarja de capitão ao Neymar? Ele é muito talentoso. Mas tem apenas 23 anos e é muito imaturo fora do campo.
A decisão foi porque ele é referência para o time no gramado. E tem ótima índole. É imaturo sim. Mas a tarja de capitão está apressando essa maturidade. Ele entendeu o que aconteceu na Copa América. Nunca mais vai tomar uma atitude dessas. Fora do campo, falo para que se cuide. Está sujeito a qualquer tentações de um jovem adulto de 23 anos. Ninguém aqui quer que deixe de viver. Só saiba se preservar. Hoje qualquer celular faz a festa nas redes sociais. Nós queremos que ele seja o capitão da Seleção dentro do campo, na concentração. Na sua vida particular, embora possa ser cobrado por isso, as decisões são dele. Nós confiamos e temos certeza que o Neymar será outro na Seleção depois da Copa América.
Gilmar, a Globo noticiou que a decisão de não recorrer da suspensão de quatro partidas da Copa América, partiu da Comissão Técnica. Essa decisão tira Neymar dos dois primeiros jogos das Eliminatórias. O que passou pela cabeça de vocês?
Cosme, na Comissão Técnica ninguém é louco. Garanto para você que não foi da Comissão Técnica a decisão de não recorrer. Até porque vou dizer, no regulamento da Copa América, está claro. A suspensão dos jogos da Copa América será cumprida na próxima Copa América. Não tinha essa história de Eliminatórias. Foi um parecer técnico da Fifa. E que temos esperança de reverter. Isso ainda não acabou. Porque Copa América é Copa América. Eliminatórias são Eliminatórias. No ano que vem, os Estados Unidos farão sua Copa América. Se houver uma briga generalizada em uma final, digamos, Brasil e Argentina, todos ficam suspensos para as Eliminatórias? Não tem cabimento. A punição do Neymar não ficará por isso mesmo.
Por que o Neymar não ficou com o grupo. Que capitão é esse? Farreia enquanto o time está decidindo sua vida na Copa América?
O Neymar foi muito sincero conosco. Disse que iria atrapalhar. E prejudicar o ambiente. Sabia que seria o principal foco da imprensa. Se chegasse para um treino rindo, escreveriam que ele não estava nem um pouco preocupado com a suspensão. Se chegasse com a cara amarrada, tinha ficado forçado. Então, o melhor era sair. Eu e o Dunga concordamos. Queriam ver o grupo sem Neymar. Por uma questão de falta de sorte nos pênaltis, o Brasil caiu. Mas é isso. A Seleção não pode depender de ninguém.
Gilmar, vamos falar a verdade. Este Brasil é sim refém do Neymar. E muuuito.
Cosme, a Argentina tem o Messi. Portugal tem Cristiano Ronaldo. E o Brasil parece que tem raiva de ter o Neymar. Ele é um dos melhores jogadores do mundo. Faria diferença atuando em qualquer seleção. Nós temos é de dar graças a Deus por ele ser brasileiro. E não o perseguir.
A cobertura da imprensa brasileira em relação a Neymar é de raiva. Como se ele tivesse culpa de a Seleção não ter outros jogadores com sua capacidade acima do normal. Mas temos outros excelentes jogadores. O Neymar chama toda a atenção por seu talento, seu carisma. Mas o Brasil não é só ele, não. Mas temo de ficar gratos todos os dias por ele ser brasileiro. Tem apenas 23 anos. Fará muito pelo nosso futebol. Assim como o Oscar, o Willian e tantos outros. Sem ter o potencial do Neymar, mas sendo ótimos jogadores.
Você e o Dunga deixaram claro. Jogadores que foram vendidos para centros mais atrasados como China e Oriente Médio terão de se desdobrar para serem chamados.
É verdade. Falamos abertamente a todos que foram vendidos para lá. A exigência da Seleção Brasileira é muito maior do que um clube chinês ou do Oriente Médio. A perda está no treinamento, leve demais para as nossas exigências. A saída? Contratar um preparador físico particular. Não nos interessa jogadores que treinem um ou duas vezes por semana. Deixarão de ser chamados. O futebol moderno de alto nível exige cada vez mais intensidade, preparo. Quem não se virar, pode ficar rico. Mas não será chamado mais para a Seleção. Seja quem for. Simples assim.
Gilmar, por favor, e em relação aos psicólogos? A Seleção Brasileira, principalmente essa geração, já mostrou enorme descontrole. Na Copa do Mundo de 2014 foi um desastre. Choro para todo lado. Na Copa América, Neymar deu o vexame que deu. E o time travou sem ele contra o Paraguai. O Thiago Silva não chorou. Mas resolveu dar um tapa na bola na área. Depois não se lembrava do que fez. Será que vocês não enxergam que é preciso um psicólogo para esses jogadores?
Não há como. Primeiro os jogadores rejeitam. Não querem nem ouvir falar. Falei com alguns psicólogos e eles disseram que não há tempo para um trabalho profundo. Eles não se abrem. Nem em competições longas, como Copa do Mundo. Não adianta. Isso já foi discutido. Os atletas não querem. A rejeição é enorme. Se forçarmos criaremos só mais um problema. Esse lado acabará ficando para o Dunga, para os jogadores mais vividos. Só posso dizer que a Seleção mudou muito psicologicamente em relação à Copa do Mundo.
Jornalistas sul-americanos garantem que a Conmebol forçará o Brasil a escolher apenas duas sedes para a Seleção Brasileira. Se for isso, Rio de Janeiro é certeza. A outra será Fortaleza, Recife ou Salvador? São Paulo vocês não são loucos de jogar. Aqui a falta de paciência é enorme...
Por mim, jogaríamos em São Paulo sem medo. Essa questão de torcida é o time que faz com que apoie ou vaie. Não está confirmado que serão apenas duas sedes. Eu gostaria que fosse como antes. Assim se tivermos de jogar nas montanhas de 3.600 metros, no frio, tudo bem. No jogo da volta, iríamos para o Nordeste no calor sufocante. Se tivéssemos de pegar um calor danado na Venezuela, levaríamos a partida daqui para Porto Alegre. Enfim, seria uma grande arma. Mas se forem definidas mesmo apenas duas sedes, a lógica aponta que uma será no Rio. Por causa da nossa concentração, a Granja Comary. A outra, escolheríamos junto com o Dunga, com a presidência.
Você é coordenador da Seleção. O que acha de treinar na Granja Comary, com a ameaça constante de neblina? A Seleção continuará exposta como foi na Copa do Mundo?
Foi ótimo você perguntar sobre isso. A Granja Comary é a nossa concentração, ponto final. Eu procurei me informar sobre o que aconteceu na Copa. E li alguns posts seus sobre a falta de privacidade total dos jogadores. Fiquei chocado. E era absoluta verdade. Isso não acontecerá mais. Estou garantindo. O acesso a veículos de comunicação estará limitado como acontece em qualquer lugar civilizado do mundo. Seleção Brasileira precisa ser levada a sério, muito a sério. Quando precisar treinar fechado, sem a imprensa acompanhar, vai treinar. Concentração não é lugar para farra, de artistas. Lá é o lugar da Seleção. Há um muro, que não é o da vergonha, como escreveram por aí. Mas um muro de dois metros que permite que os jogadores treinem em paz. A própria população de Teresópolis concordou. A farra acabou. Vamos trabalhar de forma séria.
Você trará treinadores estrangeiros para dar palestras na CBF?
Sim. Mas ninguém virá aqui ensinar como o Brasil terá de fazer para ganhar. Mas que mostrem como trabalham. Sou favorável ao intercâmbio de ideias. Primeiro quero técnicos sul-americanos. O Sampaoli é sim o primeiro da lista. Seu trabalho no Chile é excelente. Seus métodos são interessantes. Quero também que o Gareca venha e explique porque um treinador competente como ele, que faz ótimo trabalho no Peru, não conseguiu se impor no Palmeiras. Sou muito aberto a ideias. Poderemos até ouvir técnicos europeus também, por que não? Não temos preconceito ou medo. As pessoas rejeitaram os nomes de Felipão, Parreira, Zagallo, Carlos Alberto, Lazaroni. Mas é preciso aprender com os acertos e erros no passado. Assim como pensar novas ideias para o futuro. Quero também fazer uma sessão com jornalistas. A CBF quer ouvir o que vocês têm para acrescentar. Criticar é fácil. Difícil é sugerir mudanças factíveis.
Isso não é querer fugir da responsabilidade de vocês? Se o Brasil perder depois desses encontros, a derrota também passa a ser dos técnicos sul-americanos, dos ex-treinadores da Seleção, dos jornalistas...
Não. Vamos ouvir a todos e selecionar o que for melhor. A escolha será sempre nossa. Assim como a responsabilidade. Tudo que acontecer em relação à Seleção, o Marco Polo, eu e o Gilmar seremos os responsáveis.
Você foi campeão do mundo em 94. Não sente a rejeição da população em relação à Seleção? O Marin está preso. O Marco Polo não foi para a Fifa por medo de ser extraditado. A corrupção domina a Fifa. Os brasileiros não rejeitam a Seleção da CBF?
Os brasileiros precisam separar as coisas. Há a Seleção e há a CBF. Eu mesmo errei. Quando me perguntaram se eu concordava com o Parreira. Indagaram se eu achava que a CBF era o Brasil que tinha dado certo. Eu concordei, sem pensar. Na verdade queria falar que a Seleção Brasileira é o Brasil que deu certo.
A Seleção é pentacampeã do mundo. Ninguém tem cinco títulos como nós. A CBF é uma entidade que organiza o futebol e está se modernizando. Há várias acusações, mas não se provou nada contra o Marco Polo del Nero. Nada. Mas isso é problema dele. Eu estou trabalhando para tentar fazer o melhor para a Seleção.
A Seleção representa o nosso povo. O nosso país. Ela não é da CBF. É dos brasileiros. Até porque temos uma geração jovem, que não está pronta, ela precisa ainda mais de apoio. Já foi muito massacrada. E a população pode confiar. Chegaremos muito fortes nas Eliminatórias, nas Olimpíadas e na Copa da Rússia.
Não há porque nos rejeitar. A Seleção representa o Brasil. É motivo de felicidade...
Blog Cosme Rímoli